DESCARAMENTO
Mas de Luiz Inácio
Lula da Silva,
governante eleito em
eleições legítimas,
presidente
constitucional de um
país democrático
como o Brasil, seria
de esperar, pelo
menos, uma atitude
um pouco mais digna
e coerente com a
cultura democrática
que teoricamente ele
representa, e não o
descaramento
indecente de
exibir-se, risonho e
cúmplice, com os
assassinos virtuais
de um dissidente
democrático,
legitimando com sua
presença e seu
proceder a caçada de
opositores
desencadeada pelo
regime no mesmo
instante em que ele
era fotografado
abraçando os algozes
de Zapata.
O presidente Lula
sabia perfeitamente
o que estava
fazendo. Antes de
viajar para Cuba, 50
dissidentes lhe
haviam pedido uma
audiência durante
sua estadia em
Havana para que
intercedesse perante
as autoridades da
ilha pela libertação
dos presos políticos
martirizados, como
Zapata, nos
calabouços cubanos.
Ele se negou a ambas
as coisas.
Não os recebeu nem
defendeu sua causa
em suas duas visitas
anteriores à ilha,
cujo regime
liberticida sempre
elogiou sem o menor
eufemismo.
Além disso, este
comportamento do
presidente
brasileiro
caracterizou todo o
seu mandato. Há anos
que, em sua política
exterior, ele
desmente de maneira
sistemática sua
política interna, na
qual respeita as
regras do estado de
direito, e, em
matéria econômica,
em vez das receitas
marxistas que
propunha quando era
sindicalista e
candidato -
dirigismo econômico,
estatizações,
repúdio dos
investimentos
estrangeiros, etc.
-, promove uma
economia de mercado
e da livre
iniciativa como
qualquer estadista
social-democrata
europeu.
Mas, quando se trata
do exterior, o
presidente Lula se
despe de suas
vestimentas
democráticas e
abraça o comandante
Chávez, Evo Morales,
o comandante Ortega,
ou seja, com a
escória da América
Latina, e não tem o
menor escrúpulo em
abrir as portas
diplomáticas e
econômicas do Brasil
aos sátrapas
teocráticos
integristas do Irã.
O que significa esta
duplicidade? Que
Lula nunca mudou de
verdade? Que é um
simples mascarado,
capaz de todas as
piruetas
ideológicas, um
político medíocre
sem espinha dorsal
cívica e moral?
Segundo alguns, os
desígnios
geopolíticos para o
Brasil do presidente
Lula estão acima de
questiúnculas como
Cuba, ou a Coreia do
Norte, uma das
ditaduras onde se
cometem as piores
violações dos
direitos humanos e
onde há mais presos
políticos.
O importante para
ele são coisas mais
transcendentes como
o Porto de Mariel,
que o Brasil está
financiando com US$
300 milhões, ou a
próxima construção
pela Petrobrás de
uma fábrica de
lubrificantes em
Havana. Diante de
realizações deste
porte, o que poderia
importar ao
"estadista"
brasileiro que um
pedreiro cubano
qualquer, e ainda
por cima negro e
pobre, morresse de
fome clamando por
ninharias como a
liberdade? Na
verdade, tudo isto
significa,
infelizmente, que
Lula é um típico
mandatário
"democrático"
latino-americano.
Quase todos eles são
do mesmo feitio, e
quase todos, uns
mais, outros menos,
embora - quando não
têm mais remédio -
praticam a
democracia no seio
dos seus próprios
países, mas, no
exterior, não têm
nenhuma vergonha,
como Lula, em
cortejar ditadores e
demagogos, porque
acham, coitados, que
desta maneira os
tapinhas amistosos
lhes proporcionarão
uma credencial de
"progressistas" que
os livrará de
greves, revoluções e
de campanhas
internacionais
acusando-os de
violar os direitos
humanos.
Como lembra o
analista peruano
Fernando Rospigliosi,
em um artigo
admirável: "Enquanto
Zapata morria
lentamente, os
presidentes da
América Latina -
entre eles o algoz
cubano - reuniam-se
no México para criar
uma organização
(mais uma!)
regional. Nem uma
palavra saiu dali
para exigir a
liberdade ou um
melhor tratamento
para os mais de 200
presos políticos
cubanos." O único
que se atreveu a
protestar - um justo
entre os fariseus -
foi o presidente
eleito do Chile,
Sebastián Piñera.
De modo que a cara
de qualquer um
destes chefes de
Estado poderia
substituir a de Luiz
Inácio Lula da
Silva, abraçando os
irmãos Castro, na
foto que me revoltou
o estômago ao ver os
jornais da manhã.
Estas caras não
representam a
liberdade, a limpeza
moral, o civismo, a
legalidade e a
coerência na América
Latina. Estes
valores estão
encarnados em
pessoas como Orlando
Zapata Tamayo, nas
Damas de Branco,
Oswaldo Payá,
Elizardo Sánchez, a
blogueira Yoani
Sánchez, e em outros
cubanos e cubanas
que, sem se deixarem
intimidar pelas
pressões, as
agressões e
humilhações
cotidianas de que
são vítimas,
continuam
enfrentando a
tirania castrista. E
se encarnam ainda,
em primeiro lugar,
nas centenas de
prisioneiros
políticos e,
sobretudo, no
jornalista
independente
Guillermo Fariñas,
que, enquanto
escrevo este artigo,
há oito dias está em
greve de fome em
Cuba para protestar
pela morte de Zapata
e exigir a
libertação dos
presos políticos.
O curioso e terrível
paradoxo é que no
interior de um dos
mais desumanos e
cruéis regimes que o
continente conheceu
se encontrem hoje os
mais dignos e
respeitáveis
políticos da América
Latina.