Historicidades - curso de extensão

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Raquel Taraborelli

Raquel Taraborelli

Instituto Packter


 

            

- Me disseram... - Disseram-me - Hein? - O correto é ‘disseram-me’. Não ‘me disseram’. - Eu falo como quero. E ti digo mais... Ou ‘digo-te’? - O quê? - Digo-te que você... - O ‘te’ e o ‘você’ não combinam. - Lhe digo? - Também não. O que você ia me dizer? - Que você ta sendo grosseiro, pedante e chato. E que vou ti partir a cara. Lhe partir a cara. Partir a sua cara. Como é que se diz? - Partir-te a cara. - Pois é. Partir-la hei de, se você não parar de me corrigir. Ou corrigir-me. - É para o seu bem. - Dispenso as suas correções. Vê se esquece- me. Falo como bem entender. Mas uma correção e eu... - O quê? - O mato. - Que mato? - Mato-o. Mato-lhe. Matar- lhe- ei- te. Ouviu bem? - Eu só estava querendo... - Pois esqueça- o e pára- te. Pronome no lugar certo é para elitismo. - Se você prefere falar errado... - Falo como todo mundo fala. O importante é me entenderem. Ou entenderem- me? - No caso... Não sei. - Ah, não sabes? Não o sabes? Sabes- lo não? - Esquece. - Não. Como ‘esquece’ ou ‘esqueça’? Ilumine- me. Mo diga. Ensines- lo- me, Vamos. - Depende. - Depende. Perfeito. Não o sabes. Ensinar- me- lo- ias se o soubesse, mas não sabes-o. - Está bem, está bem. Desculpe. Fale como quiser. - Agradeço-lhe a permissão para falar errado que me dás. Mas não posso mais dizer-lo-te o que dizer-te-eia. - Por quê? - Porque, como todo esse papo, esqueci-lo.”

Veríssimo, Luis Fernando. Novas comédias da vida pública – a versão dos afogados. Porto Alegre: L&PM, 1997.

 

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